Marisa Medeiros Santos
Antes que se estude o problema da legitimidade da ação civil pública, imprescindível é que se tenha uma idéia geral dessa ação que veio revlucionar o sistema processual vigente, pelas inovações que introduziu.
A ação civil pública surgiu com
a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985 com o objetivo de apurar a responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artírtisco, estético, histórico, turístico e paisagistico.
Posteriormente, com
a promulgação da Lei nº 8.078/90- o Código do Consumidor- passou a ação civil pública a tutelar, também, outros interesses difusos e coletivos.
Em caso de desistência infundada ou abandono da causa, o Ministério Público, e agora com a Lei
nº 8.078/90 qualquer outro legitimado, podem assumir a titularidade ativa da ação. Já se sabe que legitimados para promover a ação civil pública são o Ministério Público, a União Federal, os Estados, os Municípios, as autarquias, as empresas públicas,
as sociedades de economia mista e as associações civis.
O estudo da ação civil pública não é novidade, mas só agora é ela mais efetivamente utilizada e, por isso, sempre há novos aspectos que merecem ser objeto de considerações, a exemplo
da legitimidade e da coisa julgada.
Os obstáculos que poderiam entravar a utilizaçào desse novo instrumento foram eliminados com a promulgação da Lei nº 8.078/90- o Código do Consumidor- que, alternado dispositivos da Lei nº 7.347/85, facilitou
o acesso à justiça e procurou encurtar as distâncias entre a dogmática jurídica e a realidade social.
É comum que se procure identificar a ação civil pública com a ação popular, especialmente depois da nova ordem constitucional.
Ocorre,
no entanto, que são muitas as diferenças existentes entre esses dois tipos de ações.
Enquanto a ação civil pública tem natureza condenatória, a ação popular tem natureza declaratória ou constitutiva.
O titular da ação popular é o cidadão,
pessoa física, a ação civil pública é promovida por pessoas jurídicas, além do Ministério Público.
Sendo a ação civil públia julgada procedente e havendo condenação em dinheiro, este será destinado a um fun do para reconstituição de bens lesados.
Outra característica singular dessa ação é que a sentença nela proferida faz coisa julgada erga omnes, salvo se a ação for julgada improcedente por falta de provas, caso em que se poderá ajuizar nova ação, se obtidas novas provas.
Problemas
se põe quando se discute a legitimidade. É que na ação civil pública a legitimidade ganha contornos próprios.
Tradicionalmente, e na precisa definição de Chiovenda, legitimidade é a identidade da pessoa do autor com a pessoa favorecida pela
lei, e a da pessoa do réu com a pessoa obrigada.
Na ação civil pública, comumente se premite que se postule, em nome próprio, direito de outrem e, dessa forma, ação é proposta por quem não é o titular do direito material. Tem-se , assim, o
caso da legitimação extraordinária.
A legitimação extraordinária difera da ordinária. Epharaim de Campos Júnior, sobre a distinção entre dois tipos de legitimação, leciona:
” Em síntese, quando existe identidade de sujeitos na relação
jurídica material e na processual, isto é, quando a parte se afirma titular do direito em litígio, a legitimação é ordinária; inexistente esta coincidência, a legitimação é extraordinária, pois o direito de agir é exercido por quem não é titular do
direito deduzido na pretensão, ou é exercido contra ou em face de quem a ela não resistiu”.
Vê-se, assim, que na ação civil pública há um rompimento com o processo civil tradicional, uma vez que nem sempre coincidem as figuras do interessado,
que é o titular do interesse, e do legitimado, que é aquele a quem a lei confere o poder de agir.
Wilson de Souza Campos Batalha entende que, na ação civil pública, não ocorre o fenômeno da substituição processual. Segundo ele, o autor da
ação civil pública age por direito próprio para defesa de direitos comunitários inespecíficos e, dessa forma, não representa os que tenham interesse reflexos. Estes, inclusive, podem propor ação de indenização se entenderem prejudicado o seu direito
subjetivo.
Em relação à substituição processual a matéria está pacificada. Vale ressaltar, contudo , que a opinião de Batalha é minoritária. Para a grande maioria dos autores, há substituição processual na ação civil pública. É a essa última
corrente que nos filiamos.
Quanto à legitimidade do Ministério Público, vez por outra, deixa marge a dúvidas.
É pacífico que se há interesse pública está o Ministério Público legitimado agir.
Ocorre que nem sempre o interesse
público é perfeitamente identificável ou, dizendo melhor, às vezes é difícil caracterizar certo interesse com público ou não.
O Ministério Público atua na defesa dos interesses difusos e é preciso diferenciar, com precisão, estes dos outros
tipos de interesses, sob pena de se criar obstáculos à utilização da ação civil pública.
No estudo do Direito Comparado, sempre profícuo, observa-se que a ação popular ambiental norte-americana, chamada de citizen action ou citizen suit,
é extremamente liberal em matéria de legitimidade. É que a citizen action constitui direito público, exercitável por qualquer cidadão que , extraordinariamente legitimado, pode promover a ação para obrigar o Estado e os poluidores a respeitarem a
legislação ambiental. Embora esse tipo de ação tenha natureza preventiva ou acautelatória já serve de exemplo para mostrar o quanto é válido ampliar as hipóteses de legitimidade ad causam.
Na verdade, parecem infudadas as críticas à ação civil
pública e à ampliação da legitimidade para a sua propositura. Dificultar o acesso à justiça parece interessar apenas aos que têm certeza da condenação e por isso querem usar de todos os artifícios para procerastinarem os feitos.
BIBLIOGRAFIA
– ANTUNES, Paulo de Bessa. Curso de Direito Ambiental: doutrina, legislação e jurisprudência. 2 ed. Rio de Janeiro, Renovar, 1992.
– ALMEIDA, João Batista de. A ação civil para a defesa do consumidor. Suplemento Direito @ Justiça.
Jornal Correio Brasiliense. Brasilia, 2 de novembro de 1992.
– BATALHA, Wilson de Souza Campos. Direito Processual das Coletividades e dos Grupos. 2 ed. São Paulo, LTR, 1992.
– BENJAMIM, Antônio Herman V. A citizen Action Norte-americana
e a tutela ambiental. Revista AJURIS. Ano XVIII. nº 53. novembro -1991. Porto Alegre.
– MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em Juízo: meio ambiente, consumidor e oturos interesses difusos e coletivos. 4 ed. ampl. e atual.
São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1992.
– MILARE, Edis. A Ação Civil Pública na Nova Ordem Constitucional. São Paulo, Saraiva, 1990.
– REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Edição Especial n. 19. Porto
Alegre, 1986.